O ano de 2020, atípico para a saúde pública e a vida em sociedade, trouxe impactos profundos, também, para as vocações. Com o cenário imposto pela pandemia de Covid 19, a proximidade com os jovens ficou comprometida e trouxe desafios para o itinerário empreendido no marista junto aqueles que estão na fase de discernimento do projeto de vida.
No entanto, mesmo diante das limitações, muito foi feito e vários caminhos se abriram para um porvir ainda incerto, mas com possibilidades criativas de superação e realização de projetos. Essa é a visão do Irmão Márcio Henrique Ferreira da Costa, diretor do Setor de Vida Consagrada e Laicato da Província Marista Brasil Centro-Norte e integrante da Comissão Internacional de Irmãos Hoje (Instituto Marista). Teólogo, pedagogo e psicólogo, especialista em Animação Vocacional, ele traça, nesta entrevista, os desafios enfrentados pela área nos últimos meses, apresenta as iniciativas empreendidas e as tendências de futuro.
1. Desde o início da pandemia no Brasil, do final de fevereiro até outubro de 2020, quais os principais desafios enfrentados pelas vocações religiosa, laical e de ministério ordenado?
Os principais desafios têm sido a impossibilidade dos encontros presenciais, momentos de acompanhamento, vivência, partilha de vida e a realização de projetos e ações que exijam presença e diálogo. Uma vez que esses movimentos são essenciais para o trabalho vocacional, ficar sem desenvolvê-los foi impactante.
2.Quais iniciativas da Província Marista Brasil Centro-Norte foram empreendidas para identificar e alimentar novas vocações para a congregação nesse período?
Projetos e ações realizados em 2020, adaptados ao período da pandemia:
Revisão do itinerário vocacional: trabalho desenvolvido pela Comissão Provincial Vocacional, com a análise de cada subsídio do itinerário e a atualização deles com novas ideias e perspectivas.
CHAMAR: projeto criado especificamente para o tempo da pandemia, proporciona encontros e reflexões virtuais com os vocacionados. O nome CHAMAR, para além do objetivo de convidar os jovens aos encontros, junta as siglas iniciais de Champagnat e Maria. A iniciativa aborda, de forma significativa, assuntos acerca do projeto de vida e de valores que podem ser vivenciados no tempo em que vivemos.
REMOV: o Retiro Marista de Opção de Vida ocorreu em setembro, de forma virtual, com oito jovens que concluíam o processo vocacional. Do grupo, cinco escolheram a vida religiosa Marista.
VITALIZAR: a ação reúne os jovens, de forma virtual, de outubro a dezembro, em preparação para o ingresso na casa de formação em 2021.
Conexão Marista: acompanhamento virtual das lideranças e jovens das cidades e locais onde não temos presença marista, a fim de despertarem para estar conosco na caminhada de discernimento.
Nucleadores: sob acompanhamento dos coordenadores regionais, proporcionou informação, formação e acompanhamento dos processos.
Escola vocacional: a equipe pensou em ciclos formativos virtuais, acolhendo cerca de 500 religiosos/as, leigos e leigas de outras congregações.
Semana Vocacional: aconteceu de forma virtual no mês de agosto, com o tema “Vocação, qual seu propósito?”
3.Como tem sido o trabalho nas casas de formação e a vida em comunidade com as restrições do distanciamento social? Quais os aprendizados?
Este tempo tem sido desafiador, também, para o processo formativo. As casas de formação da província seguiram devidamente as orientações do Ministério da Saúde. Os Irmãos Formadores obedeceram à risca os protocolos de acordo com as orientações locais. Estamos, ainda, sendo rigorosos quanto ao isolamento e aos cuidados, uma vez que a casa de formação reúne grupo significativo de pessoas. Todavia, posso destacar que a vivência em comunidade tem crescido com intensidade, bem como, os momentos de espiritualidade e as partilhas de vida.
4.O acompanhamento dos vocacionados ficou comprometido? Quais as principais adaptações?
O acompanhamento vocacional teve um profundo impacto, sim. Este ficou dependente da ferramenta virtual, que nem sempre é eficaz e confiável. Porém, as adaptações necessárias em tempos de Covid 19 tiveram significativo esforço e excelência em criatividade.
5.Como vê o futuro das vocações no cenário pós-pandemia? Indique as principais tendências e cenários.
Certamente, o futuro nos desafiará como animadores vocacionais, de tal forma que os projetos e ações exigirão um profundo movimento de adaptação ao contexto juvenil que surgirá no tempo pós-pandemia.
Algumas tendências que podem nos questionar como instituição religiosa:
Sociedade virtual: como lidar com esse contexto e nos adaptar para ter processos profundos?
Cultura do descartável: até que ponto nossos projetos e ações oferecerão valores e perspectivas essenciais para a vida, uma vez que a tendência ao desenvolvimento descartável é cada vez mais presente?
Imediatismo: o que a animação vocacional vai apresentar de diferencial para um cenário juvenil imediatista, em que o desejo do ter se estabelece de um dia para o outro?
Limitação das relações interpessoais: como o isolamento nos proporciona distanciamento uns dos outros, uma tendência é que as relações interpessoais se enfraqueçam, ou pelo menos sofram significativos impactos. Como podemos reverter a situação? Isso exigirá um novo momento como seres em relação.
6.Pode sugerir fontes de pesquisa e aprofundamento no tema das vocações, além de lives e vídeos?
COSTA, Márcio. Discernimento Vocacional: estratégias, subjetividades e itinerários. São Paulo: Editora Paulinas, 2019.
LISBOA, José Moreira. Evangelho da Vocação: dimensão vocacional da evangelização. São Paulo: Editora Loyola, 2003.
LISBOA, José Moreira. Nossa resposta ao amor: teologia das vocações específicas. São Paulo: Editora Loyola, 2001.
AGUIAR, Junqueira Maria. A escolha na orientação profissional: contribuições da psicologia sócio-histórica. Psic. da Ed., São Paulo, 23, 2º sem. de 2006, pp. 11-25.
BOCK, Silvio Duarte. A escolha profissional de sujeitos de baixa renda recém egressos do ensino médio / Silvio Duarte Bock. — Campinas, SP: [s.n.], 2008.
BASTOS, J. C. (2005a). Orientação vocacional/profissional de abordagem sócio-histórica: Uma proposta de concretização da orientação para o trabalho sugerida pelos parâmetros curriculares nacionais. Virtú, 2. Retirado em 03 julho 2007, de http://www.virtu.ufjf.br/artigo 02.doc.